“O meu cinema é uma tentativa de participar das lutas políticas por transformação.”

SILVIO TENDLER

Biografia

Silvio Tendler, por Gabriela Nehring.

Conhecido como “o cineasta dos sonhos interrompidos”, Silvio Tendler iniciou sua trajetória no cinema através do Movimento Cineclubista, em meados dos anos sessenta. No tempo em que os jovens sonhavam em ser cineastas, e não havia escolas de cinema no Rio de Janeiro, o cineclubismo torna-se um meio fundamental na formação de uma geração e um importante ponto de convergência de debates, sobretudo, em uma conjuntura marcada pela crescente politização dos movimentos artístico-culturais.

No emblemático ano de 1968, Silvio Tendler assume a Presidência da Federação de Cineclubes do Rio de Janeiro. No mesmo ano, atua como Assistente de Direção de Paulo Alberto de Barros – posteriormente conhecido como Artur da Távora – no curta-metragem “Fantasia para ator e TV”, produzido por Zelito Vianna (Mapa Filmes) e realiza seu primeiro filme, sobre a Revolta da Chibata, após conhecer o marinheiro João Cândido por intermédio de Ricardo Cravo Albim, então diretor do Museu de Imagem e Som, e de Adalberto do Nascimento Cândido, o Candinho.

O início dos anos de chumbo, no entanto, levaram o responsável pela guarda dos negativos originais de seu filme a queimá-los, restando, apenas suas memórias daquele encontro e uma fotografia do Almirante Negro, que guarda consigo até os dias de hoje.

Em 1969, inicia o curso de Direito na Pontifícia Universidade Católica, no Rio de Janeiro. Durante uma de suas aulas de “Introdução à Ciência do Direito” lê uma nota no jornal sobre a prisão dos advogados de presos políticos e decide abandonar a faculdade para dedicar-se ao cinema.

Em outubro do mesmo ano, um de seus companheiros da Federação de Cineclubes, Elmar Soares de Oliveira, sequestra um avião comercial brasileiro levando-o para Havana, em Cuba. Diante da situação política gerada pelo episódio, Silvio torna-se réu de um Inquérito Policial Militar e, com a ajuda do Coronel Aviador Afrânio Aguiar, consegue se desvincular das acusações, permanecendo, ainda, no Brasil cerca de um ano até a decisão de deixar o país.

Em 10 de novembro de 1970, seis dias após a posse de Salvador Allende, Silvio Tendler chega ao Chile. Nos dois anos seguintes, dedica-se integralmente ao cinema: atua como cinegrafista, participa da Chilefilms, da Editora Nacional Quimantú e de diversas atividades culturais, além de realizar um filme sobre a política governamental chilena intitulado “La Cultura Popular Vá!” cuja epígrafe, de autoria de Régis Debray, anunciava o tom da obra: “Hay que arrebatarse de la burguesia el privilégio de la belleza”!

Em 1972 viaja para a França para dar continuidade a seus estudos em cinema, onde, também desenvolve trabalhos com o grupo Société pour le lancement des oeuvres nouvelles (SLON), posteriormente denominado Image, Son, Kinescope et Réalisations Audiovisuelles (ISKRA), ligado à Chris Marker.

Em Paris, conhece Jean Rouch, por intermédio de Pierre Kast, que lhe incentiva a cursar a Especialização em Cinema Documental aplicado às Ciências Sociais, no Musée Guimet, finalizada em 1973.

No mesmo ano, Silvio retorna ao Chile de férias, pouco tempo antes do Golpe de Estado que colocaria fim ao regime democrático do país. De volta à França, ainda em 1973, integra o Coletivo formado por Chris Marker, Armand Mattelart e Jacqueline Meppiel – com o apoio de Valérie Mayoux, François Perier, Jean-Michel Folon, Jean-Claude Bloy e Pierre Flemónt – para a realização do filme “La Spirale”, produzido pela Reganne Films, de Jacques Perrin, sobre os eventos que ocorreram no Chile, da eleição de Salvador Allende, até sua violenta derrubada três anos depois.

Em 1975, forma-se em História, pela Université de Paris VII. Na mesma época, frequenta o seminário “L’ Histoire pour quoi faire”, organizado pelo Departamento de História daquela Universidade, com a presença de intelectuais como Jean Chesneaux e Pierre Vidal-Naquet, e participa da primeira turma do Curso de Cinema e História orientada por Marc Ferro.

Em 1976, finaliza seu Mestrado em Cinema e História pela École des Hautes-Études/Paris VII – Sorbonne, desenvolvendo uma ampla pesquisa sobre Joris Ivens, a partir da análise de seus arquivos pessoais.

No mesmo ano retorna ao Brasil e dá início à realização de seu primeiro longa-metragem, “Os anos JK – Uma trajetória política”, com a produção da Terra Filmes, do produtor Hélio Ferraz.

Em 1977, ministra o curso pioneiro de Cinema e História na Pontifícia Universidade Católica, do Rio de Janeiro. Dois anos mais tarde, em 1979, passa a integrar o corpo docente do Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio, onde leciona até os dias de hoje.

Em 1980, lança o filme “Os anos JK – Uma trajetória política”.

Em 1981, é convidado por Paulo Aragão Neto a dirigir o filme “O Mundo Mágico dos Trapalhões”, realizado pela Renato Aragão Produções.

No mesmo ano inicia o desenvolvimento do longa-metragem “Jango”, sobre a carreira política de João Belchior Marques Goulart, presidente deposto pelos militares em 1º de abril de 1964. Não encontrando parceiros que aceitassem tal empreitada em plena Ditadura Militar, Silvio Tendler cria a Caliban Produções Cinematográficas, empresa especializada na produção de biografias históricas de cunho social e lança “Jango”, em 1984. No mesmo ano recebe a Medalha Pedro Ernesto, do Município do Rio de Janeiro. 

Em 1986, contribuiu para a Fundação do Novo Cinema Latino-americano, Festival Internacional del Nuevo Cine Latinoamericano e do Comitê de Cineastas da América Latina. No mesmo ano realiza “Rondônia: Viagem à terra prometida”, vídeo exibido pela TV Manchete dentro da série “Os Caminhos da Sobrevivência” e o “Programa Nacional do Partido Comunista Brasileiro”

Em 1987 produz  “Memória do Aço”, documentário sobre a formação da indústria siderúrgica no Brasil e o “Programa do Partido Socialista Brasileiro”.

Em 1988, dirigiu a Fundação Rio (RIO ARTE) e realiza três obras: “Aprender, Ensinar e Transformar”, vídeo produzido para a Fundação Educar; “Caçadores da Alma” e “Chega de Saudades”.

Em 1992 produz uma série de cinco vídeos para a Mostra Saudades do Brasil – “A Era JK”, e dois vídeos institucionais, “50 Anos da Vale do Rio Doce” e “Nossas crenças”, para a Vale do Rio Doce.

Em 1993, dirigiu o Centro Cultural Oduvaldo Vianna Filho (Castelinho do Flamengo), instituição vinculada à Secretaria Municipal de Cultura e à Prefeitura da Cidade do Rio. Dirigiu a TV Brasília, do Grupo Correio Brasiliense e o seriado “Anos Rebeldes” na TV Globo.

Em 1994 realiza o filme “Josué de Castro – Cidadão do Mundo”, produzido pela Bárbaras Produções, de Adolfo Lachtermacher.

De 1995 a 1996, foi Secretário de Cultura e Esporte do governo Cristovam Buarque, no Distrito Federal.

Em 1996 realiza o filme “Conceição das Crioulas: Vestígios de Quilombo”, rodado em Conceição das Crioulas, Distrito de Salgueiro, em Pernambuco, dentro do ciclo de comemoração dos 300 anos de Zumbi e produzido para a TV de Pernambuco.

Anos depois, em 1997, assumiu a Coordenação de Audiovisual para o Brasil e o Mercosul da Unesco, organismo vinculado às Nações Unidas voltado para a Educação e Cultura. Lança o filme “Antonieta”, produzido para o Canal Plus (França) e “Envira”, vídeo Documental sobre o Programa de Alfabetização realizado pela Comunidade Solidária do Governo Federal e adotado pela UNESCO, na cidade de Envira, no estado do Amazonas.

Em 1998 realiza o filme “Castro Alves – Retrato falado do poeta” e “Cidade Cidadã”, institucional produzido para a Prefeitura do Rio de Janeiro.

Em 2000 produz “Rio Republicano” e “Dr. Getúlio” para o Museu da República, além de “Bósnia”, uma série de quatro filmes realizados para uma peça de Luis Fernando Lobo.

Em 2001 realiza os filmes “Marighella, Retrato falado do guerrilheiro”, “Milton Santos, pensador do Brasil” e “Entrevista completa de Milton Santos”, para o Sindicato dos professores.

Em 2002 produz o institucional “Abrindo Espaços”, para a UNESCO; “Pílulas Históricas”, para o Museu da República e “JK – O menino que sonhou um país”, para a Fundação Banco do Brasil.

Em 2003, recebeu a Medalha JK – Centenário JK, do Ministério da Cultura. No mesmo ano foi homenageado pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro com inauguração da Sala de Cinema Silvio Tendler em São João de Meriti. Produz o longa e o média-metragem “Glauber – O Filme, Labirinto do Brasil”; o institucional “Oswaldo Cruz – O médico do Brasil”, para a Fiocruz; “Fragmentos do Exílio”, para a Jornada da Bahia – 30 Anos do Golpe no Chile; e “Paulo Carneiro: Espelho e Memória” e “Memória, Paz e Inclusão Digital”, para a UNESCO.

Em 2004, foi homenageado pelo Governo de Minas Gerais pela participação na campanha pelas Diretas Já e pelos 13 anos de luta do Jornal Inverta. Realiza o filme “Milton Santos – Por uma outra Globalização” e os institucionais “Correndo atrás dos sonhos”, para o SESC; “As Redes que a Unesco Tece”, para a UNESCO; “O olhar de Castro Maya”, para o Museu Castro Maya e “Institucional IRB”, para o Instituto de Resseguros do Brasil.

Em 2005, recebeu o Prêmio Golfinho de Ouro pelo conjunto da obra, concedido pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro. Realiza o filme “Memória e História em Utopia e Barbárie”.

Em 2006 lança o filme “Encontro com Milton Santos ou O Mundo Global Visto do Lado de Cá” e, em 2007, o institucional “Memória do Movimento Estudantil”, para a União Nacional dos Estudantes.

Em 2008, recebeu a Medalha Tiradentes concedida pela Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro. No mesmo ano recebeu uma homenagem retrospectiva no X Festival de Cinema de Paris.

Em 2009, foi homenageado no VIII Festival Santa Maria Vídeo e Cinema e recebe o Diploma de Honra ao Mérito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Lança os filmes “Utopia e Barbárie”, “Preto no Branco, a censura antes da imprensa”, para a TV Brasil e a série “A Era das Utopias”

Em 2010 produz a videoinstalação “Há muitas noites na noite – Poema Sujo Ferreira Gullar” no Oi Futuro Ipanema e o curta-metragem “Carta a Zelito Vianna – Ao mestre com carinho” para a Jornada de Salvador em parceria com a Mapa Filmes. 

Em 2011, recebeu o Notório Saber, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. No mesmo ano foi homenageado com uma Mostra de Cinema “O Documentário Segundo Silvio Tendler” realizada pela IBRACINE – Ibero Brasil Cine Festival. Realiza os filmes “Tancredo, A Travessia”, “O Veneno está na mesa”, “Matzeiva, Juliano” e “Giap, Memórias Centenárias de Resistência”.

Em 2012, recebeu o Prêmio Parceiros da Paz e da Sustentabilidade 2012 – 2016 concedido pela Agência Brasil Sustentável e foi homenageado no Festival do Audiovisual Luso Afro Brasileiro, FestFilmes. Realiza a série “Caçadores da Alma II”.

Em 2013, foi homenageado pelo Talento em traduzir a identidade brasileira, pela COPPE-UFRJ e no Festival Internacional de Biografias. Recebeu o Título de Cidadão de Niterói, concedido pela Câmara Municipal de Niterói. No mesmo ano recebeu a Medalha Chico Mendes de Resistência, concedida pela Associação Brasileira de Imprensa. Realiza os filmes “Sujeito Oculto na Rota do Grande Sertão” e “O Brasil na Terra do Misha”.

Em 2014, recebeu o Troféu Fundação Memorial da América Latina, do IX Festival de Cinema Latino Americano de São Paulo. Realiza os filmes “Agricultura Tamanho Família – Uma alternativa ao agronegócio”, “J. Carlos – O Cronista do Rio”, “O Veneno está na Mesa II”, “Militares da Democracia: os militares que disseram Não”, “Os Advogados contra a Ditadura: Por uma questão de Justiça” e “Privatizações: a Distopia do Capital”; além das séries “Brasil Místico”, “Os Advogados contra a Ditadura” e “Militares da Democracia: As histórias dos militares que resistiram ao golpe de 64”.

Em 2015 lançou os filmes “Parir é natural” e “Haroldo Costa – O Nosso Orfeu”, além da série “Há muitas noites na noite”

Em dezembro, Silvio recebeu, das mãos de Victor Álvarez, filho de Santiago Álvarez, o “Prêmio Noticiário ICAIC”, por sua obra e, sobretudo, por ter dedicado sua vida inteira à Revolução Latino-americana. Por sua aproximação com os artistas e a cultura cubana, em especial com Santiago Álvarez. O prêmio, emitido pela direção da Associação Cultural Santiago Álvarez, é concedido “a todos que trabalharam na equipe de Santiago Álvarez na produção das 1.496 emissões e à pessoas cuja vida ou obra tenham se constituído em atos culturais que contribuem para a dignidade humana e/ou deixem como resultado um passo a mais para a contrução de um mundo melhor para todos”.

Entre 2015 e 2019, Silvio Tendler produziu as séries “Sonhos Interrompidos”, “Caçadores da Alma III” e “Brasil, Travessias”; oito longas-metragens, “Alma Imoral”, “Há muitas noites na noite”, “Sonhos Interrompidos”, “Dedo na Ferida”, “Fio da Meada”, “Ferreira Gullar, Arqueologia do Poeta”, “Santiago das Américas ou o olho do Terceiro Mundo”, “Ibiúna, Primavara Brasileira”, e o curta “Castro Maya”. Em 2020, lançou “Em Busca de Carlos Zéfiro” e “Nas Asas da PanAm”. Entre as próximas produções estão o longa“Chico Mário” e a série “Arte Urbana”.

Possui as três maiores bilheterias do documentário brasileiro (“Os anos JK – Uma trajetória política”, “O Mundo Mágico dos Trapalhões” e “Jango”) e mais de sessenta prêmios, dentre eles seis Margaridas de Prata – C.N.B.B e o Prêmio Salvador Allende no Festival de Trieste, Itália, pelo conjunto da obra.

Sua trajetória revela décadas de pesquisas que deram origem a seu acervo particular de imagens, com mais de 80.000 (oitenta mil) títulos sobre a História do Brasil e do Mundo dos últimos 60 anos, sendo, possivelmente, o maior do gênero existente no Brasil.

Cronologia

Fatos da vida do Silvio entrelaçados com momentos da política brasileira e internacional